Poetas para conhecer melhor - Bocage


Manuel Maria Barbosa du Bocage – Wikipédia, a enciclopédia livre
Continuando a nossa série de poetas para conhecer melhor durante o isolamento, vou continuar em Portugal com o poeta dessa semana: Manuel Maria Barbosa du Bocage.

O poeta de hoje nasceu em Setúbal em 1765 e morreu em Lisboa em 1805. Em 1783 ele se alistou na marinha, fez o curso mas desertou no final, apesar disso foi convocado como oficial da marinha para embarcar para a Índia. Ao fugir da marinha, viveu em Macau e retornou à Portugal em 1790. Vamos conhecer um pouco mais sobre ele por suas próprias palavras, lendo o poema "Autorretrato":

Autorretrato

Magro, de olhos azuis, carão moreno,
Bem servido de pés, meão na altura,
Triste de facha, o mesmo de figura,
Nariz alto no meio e não pequeno;
Incapaz de assistir num só terreno,
Mais propenso ao furor do que à ternura;
Bebendo em níveas mãos, por taça escura,
De zelos infernais letal veneno;
Devoto incensador de mil deidades
(Digo, de moças mil) num só momento,
E somente no altar amando os frades,
Eis Bocage, em quem luz algum talento;
Saíram dele mesmo estas verdades,
Num dia em que se achou mais pachorrento.

Sobre sua obra, Bocage foi um grande expoente do arcadismo português, e se dividiu entre satírica e lírica. Ele participou da associação de poetas denominada "nova Arcádia", em 1797 nosso poeta foi preso acusado de "impiedade e antimonarquismo" após publicar o poema Cartas à Marília: 

Pavorosa Ilusão de Eternidade,
Terror dos vivos, cárcere dos mortos;
D’almas vãs sonhos vão, chamado inferno;
Sistema de política opressora,
Freio que a mão dos déspotas, dos bonzos
Forjou para a boçal credulidade;
Dogma funesto, que o remorso arraigas
Nos termos corações, e a paz lhe arrancas:
Dogma funesto, detestável crença,
Que envenena delícias inocentes! (...)

Após sua liberdade, Bocage se dedicou a traduzir textos em latim e francês.

Vamos conferir mais alguns poemas:

Oh retrato da Morte, oh Noite amiga

Oh retrato da Morte, oh Noite amiga,
Por cuja escuridão suspiro há tanto!
Calada testemunha de meu pranto,
De meus desgostos secretária antiga!

Pois manda Amor que a ti somente os diga,
Dá-lhes pio agasalho no teu manto;
Ouve-os, como costumas, ouve, enquanto
Dorme a cruel, que a delirar me obriga.

E vós, oh cortesãos da escuridade,
Fantasmas vagos, mochos piadores,
Inimigos, como eu, da claridade!

Em bandos acudi aos meus clamores;
Quero a vossa medonha sociedade,
Quero fartar meu coração de horrores.

Esperança Amorosa

Grato silêncio, trémulo arvoredo,
Sombra propícia aos crimes e aos amores,
Hoje serei feliz! --- Longe, temores,
Longe, fantasmas, ilusões do medo.

Sabei, amigos Zéfiros, que cedo
Entre os braços de Nise, entre estas flores,
Furtivas glórias, tácitos favores,
Hei-de enfim possuir: porém segredo!

Nas asas frouxos ais, brandos queixumes
Não leveis, não façais isto patente,
Quem nem quero que o saiba o pai dos numes:

Cale-se o caso a Jove omnipotente,
Porque, se ele o souber, terá ciúmes,
Vibrará contra mim seu raio ardente.

Por hoje é só, espero que vocês tenham gostado de ler um pouco de Bocage :)


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